Durante 11 dias atravessamos a Rússia de trem. Pra ser sincera, atravessamos 2/3 da Rússia em 11 dias. Começamos em Irkustk e terminamos em Moscou, de 25 de maio a 5 de junho.
Foram 4 cidades e quase 90 horas viajando nas segundas e terceiras classes, em poltronas e camas. Entre um trajeto e outro, fomos até surpreendidos pelo exército russo, que estava se deslocando para a fronteira com a Ucrânia. E eles viajaram conosco mais de uma vez (agora está explicado porque tivemos tanta dificuldade na compra das nossas passagens)! Eram muitos soldados, um batalhão de verdade. Nas duas viagens em que eles nos fizeram companhia, éramos praticamente os únicos estrangeiros e civis no vagão.
Entre idas e idas, muita gente no caminho.
Um russo que estava bêbado, muito bêbado, mas que arranhava no inglês e queria muito conversar com a gente. Ele era a pessoa que traduziu as poucas “conversas” que tivemos com os soldados. Ele queria saber o que achávamos da situação Rússia-Ucrânia, fazia umas piadas estranhas sobre Brasil (e que até agora não entendemos) e até chegou a perguntar para a tripulação do trem porque o vagão não tinha banco no corredor para eu sentar enquanto meu computador carregava (eu estava sentada no chão, esperando). Até sobre bananas ele quis conversar! Comédia!
Também conhecemos duas dançarinas de pole dance que estavam estudando inglês. Entre um papo e outro, perguntei o que elas faziam e elas me disseram que eram dançarinas e depois complementaram, pole dance. Então, eu quis ser simpática e falei que também tinha sido dançarina e complementei, balé, mas elas entenderam pole. O Paulinho complementou, todo orgulhoso, que eu tinha dançado por quase 12 anos, mas que já havia parado de dançar há 10 anos! Então elas começaram a rir e me olharam de uma forma muita engraçada, tipo: “como assim? Você era dançarina de pole dance na infância? Bom, depois de tentarmos explicar novamente, sem sucesso, deixamos por isso mesmo.
A viagem também foi cheia de cenas lindas.
Difícil começar e difícil terminar.
Pra começar, foi preciso um planejamento mais estruturado do que estávamos acostumados. Vamos tentar dar algumas dicas e mostrar o caminho das pedras para os aventureiros de plantão.
Entendendo a ferrovia
Afinal, o que é Transiberiana? Transiberiana é a linha de trem que corta toda Sibéria. Ela faz parte do complexo ferroviário da Rússia, mas é bastante famosa pela paisagens deslumbrantes que são vistas da janela e também pelo seu agitado passado, quando ela transportava de traficantes a soldados e pessoas da máfia russa. Histórias de todos os tipos não faltam no currículo dessa gigante de 10 mil quilômetros, que corta o país de leste a oeste, que nasceu em 1890 e levou mais de 13 anos para ser construída. Milhares de operários morreram nesta que foi chamada por muitos de “segunda fronteira” entre a Rússia e a China e que, de fato, protegeu e ajudou o país em várias situações de guerra.
Nos interessamos pela viagem por vários motivos: 1) promessa de paisagens inesquecíveis, 2) possibilidade de maior contanto com russos e de poder conhecê-los melhor, 3) refazer a rota tão famosa e cheia de histórias e mistérios e 4) conhecer cidades no interior da Rússia. Pouco a pouco, vamos revelando quais dessas expectativas foram atendidas.
O sistema ferroviário na Rússia é um show à parte. Começando pelas estações maravilhosas e terminando na limpeza e higiene dos vagões. Os russos se orgulham muito disso e, na maioria, são grandes fãs desse sistema de transporte.
Agora, vamos ao bê-a-ba.
Geografia e fuso horário
É possível fazer a rota inteirinha sem descer em nenhuma cidade. A mais clássica é partir de Moscou com destino a Vladivostok, no extremo oriente do país. Nesta opção, o tempo de trajeto é de 7 dias. Se a aventura permitir alguns breaks no meio do caminho (o que nós recomendamos fortemente), aí a viagem pode durar o infinito. Nós optamos por parar e conhecer 4 cidades: Irkustk, Krasnoyarsk, Yekaterinburg e Kazan.
É bem engraçado e confuso o fato de todos os trens serem controlados pelo horário de Moscou, mesmo que Vladivostok esteja a inacreditáveis 9 horas de diferença. Ou seja, os se você estiver em Irkustk e o horário de saída do seu trem para Novosibirsk estiver marcado para às 10h, esse horário é o horário em Moscou e, como Irkutsk está cinco horas a frente de Moscou, então, o trem irá partir às 15h!!! Ah, e o horário de chegada vai seguir a mesma lógica. Portanto, é imprescindível fazer os cálculos direitinho para não chegar no destino às 2h da manhã (principalmente se você for no inverno).
Existe uma teoria de que quanto menor o número do trem (mais próximo de 1), mais novo e melhor é. Nós viajamos em vários trens (com exceção do 398, que esse sim é um dos mais velhinhos) e não confirmamos essa teoria. O trem número 1 é um dos mais novos mesmo, mas encontramos trens com numeração na casa dos 100 novinhos em folha também.
Quando ir?
Essa é uma pergunta de múltipla escolha, com direito a mais de uma resposta. Depende do que você quer ver: as paisagens maravilhosas com neve ou as cidades lindonas no meio do caminho? Nós fomos ingênuos e achamos que daria para ter tudo, mas o fato é que não dá! Infelizmente…
Como viemos no verão, conseguimos conhecer bem as cidades em que paramos. Algumas com clima muito agradável e sol, como Irkutsk e Kazan. Foi show! No entanto, a paisagem ao longo da viagem deixou a desejar: sem a neve, não há nada de mais. Montanhas, animais, rios, casinhas, como em outras que já fizemos… Mas nada de tirar o fôlego, de cair o queixo
Resumo da história: decida o que quer ver e então escolha a melhor época, lembrando que dezembro e janeiro é um período de frio (quase) insuportável, mas que oferece os melhores cenários; enquanto, maio e junho dão a chance de visitar os lugares sob um sol bem simpático, mas fazem da viagem uma experiência bem pouco envolvente.
Que cabine escolher?
Os trens oferecem várias opções de cabines, para todos os gostos e preços.
Segunda classe camas: cabines fechadas com duas beliches. Dois banheiros por vagão e uma comissária que limpa tudo e ajuda os passageiros, além de acordar as pessoas quando o destino delas está próximo. É, em tese, mais segura (porque conseguimos fechar a porta da cabine), mas mais impessoal (porque acabamos não conhecendo quase ninguém). É confortável e também um ambiente mais calmo e tranquilo. Opção mais cara, claro!
Terceira classe camas: são beliches espalhadas por todo o vagão, separadas apenas por uma divisória, sem portas. Em cada espacinho ficam 3 beliches. Também possuem dois banheiros e uma comissária de bordo. Essa opção já é menos segura (as malas e mochilas ficam expostas) e mais barulhenta; porém, o contato com pessoas diferentes é bem maior e mais interessante. Normalmente, metade do preço da segunda classe.
Segunda classe poltronas: ótima e confortável. Espaço para as pernas e bancos reclináveis. Bem ok para uma viagem de até 8 horas. Mais do que isso, melhor escolher as caminhas.
Quanto e como pagar?
Essa pergunta é sempre complicada de responder. Depende da época do ano, do número do trem e da antecedência da compra. Mas vamos lá. No mês de maio, o valor médio por ticket (comprado com menos de uma semana de antecedência) é de $ 100,00/pessoa.
O site oficial do sistema de trens da Rússia é o www.rzd.ru, que está em russo, obviamente. Para o bem da humanidade, recentemente, alguém muito esperto teve a ideia de traduzir o site para o inglês, www.eng.rzd.ru e que funciona perfeitamente bem. No site, é possível consultar trechos, horários, preços, tudo o que é necessário para planejar a viagem, mas o melhor está por vir: também é possível comprar as passagens pelo site e imprimi-las na estação em máquinas de auto-atendimento.
Na compra pelo site, além dos preços serem os mesmos praticados nas estações (sem taxa, nem comissão), o serviço ainda evita a confusão com o atendente russo que não fala uma palavra em inglês. Há algumas agências como a Real Rússia que vendem passagens, mas por um sistema de reserva no qual eles levam um dia para confirmar a compra. Por isso, recomendamos fortemente o site oficial.
O site só aceita cartões Visa e Master. Mas é claro que nós não sabíamos disso e como nosso cartão é American Express, tivemos que usar o meu cartão pessoal (que estava esquecido na bagagem) para comprar a primeira passagem. Até aí, ok! No entanto, como não usamos esse cartão em nenhuma outra circunstancia (sim, galera, estou super comedida nas comprinhas), acabamos esquecendo de pagá-lo e o banco bloqueou o cartão! De repente, não conseguíamos mais comprar o restante das passagens.
Com as opções de data terminando (lembra que o governo estava transportando soldados?) e os preços aumentando, começamos a entrar em pânico… Até que tivemos a cara-de-pau de pedir ajuda para um amigo mais que querido, Mister Márcio, que em plena quarta-feira às 6h da manhã, viu nossa mensagem, nos retornou e passou os dados do cartão de crédito dele (incluindo os números do token do Itaú) pra que a gente conseguisse seguir adiante. Não sei quem foi mais louco nessa história, mas deu certo! Márcio, nem a melhor vodka aqui da Rússia retribui sua ajuda! Valeu cara!!!
Quanto tempo ficar em cada cidade?
Bom, você decidiu parar mesmo. Mas, por quanto tempo? Nós ficamos entre 1 e 3 dias em cada cidade. Em Krasnoyarsk, por exemplo, nós ficamos somente 1 dia porque queríamos apenas descansar. Já em Kazan, optamos por ficar 3 porque a cidade era muita fofa e tinha muita coisa pra fazer. No geral, acho que essa média é suficiente, não precisa de mais.
A viagem foi muito agradável e divertida, mas também um pouco cansativa. Conseguíamos dormir, ler, escrever, comer e até jogar baralho durante os trajetos, mas o deslocamento das estações até os albergues, e vice-versa (sempre com intervalos de um ou dois dias), contribuiu muito pra a diminuição da nossa energia.
Gostamos muito de conhecer o interior da Rússia e a Sibéria, mas nosso interesse principal era mesmo a viagem, que nesta época do ano não tem tantos atrativos. Foi uma viagem normal de trem sem grandes acontecimentos (com exceção do exército russo, claro) e grandes novidades! Se fôssemos refazer o roteiro, privilegiaríamos Moscou e São Petersburgo e deixaríamos a Transiberiana para o final do inverno; neste caso, muito bem agasalhados!
[…] tenho um post supercompleto, com um passo a passo, para quem quer se aventurar, mas aqui vão algumas dicas básicas para […]
[…] tenho um post supercompleto, com um passo a passo, para quem quer se aventurar, mas aqui vão algumas dicas básicas para […]
Oie! Comecei olhar para fazer a Transiberiana… A princípio no expresso transiberiano. Você
acha que vale a pena ou que é melhor a liberdade de fazer o roteiro?
Obrigada querida!!
Oi Carol, obrigada por visitar o blog. Que delícia! A Transiberiana é demais.
Eu fiz meu próprio roteiro e adorei. Acho que ter mais liberdade te permite conhecer melhor as cidades. 😉
Oi Pam!! Estou organizando uma viagem pela Transiberiana para ano que vem, saindo da Mongólia, pois vou para o festival Naadam antes.
Primeiro, muito bom o blog, com dicas ótimas e excelente forma de escrever!!
No entanto, entrei no site oficial das passagens e não consegui fazer um teste de compra para ver como funciona. Tem zilhões de informações no site, mas nenhum link direto para compra dos tickets. Pode me ajudar?
Bjus…
Oi Luciana, muito obrigada pela visita. Fiquei feliz em saber que estou ajudando. Eu amei fazer essa viagem e tenho certeza que você também irá adorar.
Então, para fazer as simulações é preciso clicar em Passengers, no canto esquerdo do site. Acho que esse link funciona também: http://pass.rzd.ru/main-pass/public/en.
Super boa sorte e volta depois pra contar como foi. um beijo
Outro dia recebi um vídeo sobre a viagem de trem pela transiberiana, partindo de Moscou e terminando em Pequim. Fiquei maluca de vontade de fazer a tal viagem. Amo viajar. Quero um período considerado baixa temporada por ser mais econômico. Por conta da minha idade, não posso viajar como mochileira eu preciso de algum conforto. Vc poderia me dar umas dicas, acho que a segunda classe eh a mais indicada para mim. Devo viajar com uma amiga que gosta tanto ou mais que eu de aventura. Ela sempre diz, só coleciono por de sol. Falando em valores, qual seria aproximadamente o custo de uma segunda classe para o período que citei acima? Obrigada
Oi Jani, que demais ler seu comentário. Espero ainda ajuda-la. Olha só, a segunda classe é boa sim pra vocês. Só precisa ficar atenta ao tipo do trem na hora de comprar. No post, eu dou algumas dicas para escolher os trens mais novos. Mas a segunda classe é confortável sim.
Sobre os valores, eles mudam muito de acordo com as estações e eu realmente aconselho vocÊ a dar uma olhada no site da companhia pra checar. Posso te passar alguma informações desatualizada.
Pense apenas no que você quer para a viagem. Se quiser ver neve, tente ir entre novembro e fevereiro. Nos meses de baixa temporada (março-maio), você também pode encontrar alguma neve e bastante frio ainda, mas deve ser bem bonito.
Se precisar de mais alguma ajudinha, estou por aqui. 😉
Pan do céu! Mentira que vc fez essa viagem?!? Morri!! Li hoje uma matéria de Portugal sobre a viagem de trem mais longa do mundo que começava em Portugal e terminava em Pequim, e um dos trens era esse transiberiano… comecei a pesquisar, e olha quem eu achei! rs
Bjs
Isa
Oi Isa!!! Sim, eu fiz! E foi sensacional, embora diferente das minhas expectativas. Tô feliz que você me achou! Quando pensar em ir, vou adorar ajudar.
um beijo grande
Pam, que viagem show! Concordo que talvez tivesse sido mais legal com as paisagens cheias de neve, mas tbm o frio é fogo pra conhecer as cidades! Eu acho que faria como vocês fizeram mesmo, pois adoro trem. Com o frio, acho que a energia cai também e a gente acaba não se entregando aos encantos das cidades! E me diz uma coisa? O que você acha de fazer este trecho sozinha? Rola? É seguro? beijão
Oi De, escolher a época na qual viajar faz muita diferença quando planejamos cruzar a Rússia pela Transiberiana. As paisagens e as possibilidades são muitos diferentes mesmo. Mas é muuuuito legal. Sobre você viajar sozinha, eu acho que não tem problema não. Eu mesma conheci uma garota em um hostel que fiquei em Irkutsk e ela estava fazendo o trajeto todo sozinha. Os trens são bem seguros e não acho que mulheres correm muitos riscos na Rússia, além daqueles que corremos em outros lugares. Bjs e obrigada pela visita!
Adoro viajar de trem!!! Quem sabe coloco este roteiro na lista! 😉
Gabi, então você vai adorar a Transiberiana. A paisagem, principalmente, no inverno é de tirar o fôlego e a qualidade da maioria dos trens é ótima. Se tiver oportunidade, farei novamente com certeza!
Obrigada pela visita! 😉
Que viagem dos sonhos!!! Será que algum dia consigo fazer???
Claaaaaro que consegue! Vou te ajudar com tudo! bjs
Adorei o post e todas as informações, mas tá ai um país que provavelmente a gente nunca vá conhecer.
Viu que lá é crime ser gay e que vai preso mesmo né? http://www.viajabi.com.br/ser-gay-agora-e-crime-na-russia
#medo
Eloah, que bom que gostou do post. É muito triste um país tão lindo, tão rico em cultura tomar decisões desse tipo. Sei que muitos russos não concordam e estão inconformados com isso, assim como eu. Mas eu não perco as esperanças não.
Olá Rose,
Visitei a Ucrânia e Russia recentemente. Ainda tem muito a ser explorado!
Quero fazer a Transiberiana de Moscou a China.
Quantos Euros você acha vou gastar não levando em consideração o aero?
OBs: nada de pacote turístico… Obrigada
Olá Rosilene, você dirigiu sua mensagem à Rosemeire ou a nós, Contos da Mochila? Se for à Rosemeire, ela provavelmente não verá porque ela é uma das nossas leitoras. 😉
Mas, nós também podemos te ajudar. Apenas com os tickets da Transiberiana você deve ter em média, 800 euros. Mas, esse valor depende muito do período da sua viagem, da classe em que vai escolher e também da antecedência com que vai comprar. É bem uma media mesmo. 😉
Pâmela querida…… adorei todas essas informações. Vai ser muito útil quando formos à Russia…. e está nos nossos planos. Lindaaaaa…… aproveite sempre e que Deus os acompanhe. Beijos….
Rose! Super legal saber que estão planejando ir pra Rússia! Pode me escrever à vontade para pedir mais dicas! bjs