Roadtrip no Alaska: Parte 2, Norte

Por Fernando Magnoler

7 dias de aurora boreal, esqui off-track, dirigir na neve, cidades-fantasmas e trilhas selvagens nas maiores montanhas dos EUA

Depois de contar pra vocês como foi minha saga pelo lado sul do Alaska, onde eu vi as primeiras paisagens cinematográficas do estado e conheci a cidade fantasma, agora é a vez de contar a outra metade da viagem, a Parte Norte.

Prepare-se para muitas emoções: cacei e encontrei a Aurora Boreal, nadei em lago praticamente congelado e fiquei perdido no meio do nada com o carro atolado.

Roadtrip no Alaska – Parte 2

Dia 4: sexta-feira, 11 de março de 2016, Glenn Highway e Fairbanks (Trilha na Stampede Road do filme Into the Wild e Aurora Boreal)

Roadtrip no Alaska

Quando acordei naquele dia não imaginava que ele seria o mais incrível de toda a minha vida.

Às 8h parti em direção ao norte, atravessando por Anchorage novamente e tomando a Glenn Highway. Depois de 4h de viagem, parei em Talkeetna para almoçar e também conhecer a famosa Nagley’s Store, um mini-mercado onde você encontra o Mayor Stubbs, um gato que foi eleito o prefeito “simbólico” desse distrito de Anchorage.

Todo dia, cerca de 30 a 40 visitantes passam pela loja apenas para conhecer o gato (coitado do gato), que tem 35 mil seguidores no Facebook. Eu tive um baita azar e ele não estava na loja no momento, mas segue uma foto do bichano.

Roadtrip no Alaska

Roadtrip no Alaska
Blueberry pie de sobremesa em Talkeetna (USD7)

Continuando minha roadtrip no Alaska rumo ao norte, mais e mais imagens de tirar o fôlego não me deixaram perceber que já estava há 7 horas dirigindo. Chego na Stampede Road para cumprir meu segundo objetivo da viagem: realizar a mesma trilha que aparece no filme Into the Wild.

Roadtrip no Alaska
Glenn Highway, logo após sair de Talkeetna

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Glenn Highway e as montanhas de Ma-Tsu

Roadtrip no Alaska

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Foi neste exato lugar que o jovem John McCandless, ou Alex Supertramper, veio de carona para a última parte da sua viagem até o Alaska na década de 90, retratado no filme Into the Wild. Quem tem menos de 30 anos e não assistiu, nem saia hoje à noite, corra o Netflix e assista. Ele pode mudar sua vida!

Roadtrip no Alaska

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O famoso ônibus 142 Fairbanks que virou residência do personagem ainda está lá, mas a 3 dias de caminhada de onde eu estava (você pode contratar guias para fazer essa caminhada, porém precisa de uma boa preparação física e financeira, hehe). Quem quiser ver no satélite do Google Maps, é só digitar 142 Magic Bus… sensacional!

A atmosfera desse lugar é de profunda paz e isolamento, e fiquei ali sentado um bom tempo, refletindo sobre a vida, até o sol descer. Pelo fato do sol percorrer o céu bem no horizonte, o por-do-sol no Alaska pode durar diversas horas. Eu acabei indo muito longe na trilha com o carro e isso não era um problema. O problema foi quando, na hora de ir embora, o carro atolou na neve!

Vídeo timelapse por do sol

Fiz de tudo para tirar ele dali: até arranquei galhos de árvores e recolhi pedras para colocar embaixo das rodas, mas nada adiantava (não quis alugar correntes para o pneu, tomei!). Não tive dúvidas, coloquei uma Trakinas num bolso, um Gatorade no outro e abandonei o carro atrás de ajuda.

Tive que correr por aproximadamente 1h e meia na quase escuridão (já eram 19h) gritando “IS ANYBODY HERE?”, morrendo de medo de algum urso entender como “QUER CARNE?”. Além disso, comecei a sentir hipotermia, principalmente quando parava de correr. Esta foi a primeira vez na vida que tive a sensação de desespero antes da morte e até gravei um vídeo no celular caso me encontrassem sem vida. Tenso!

Avistei um rancho com uma caminhonete e cortei a vegetação de tundra rumo a ele. Depois, fiquei sabendo que isso é perigoso, pois a tundra esconde muitos ninhos de cobra no inverno, enfim…

Lá no rancho, um casal de velhinhos me atendeu e deu muita risada com a história, mas o importante é que eles se empolgaram em me ajudar: foram buscar pessoas nos sítios dos arredores e com a ajuda de corda e da caminhonete, consegui tirar o carro dali. Esta é a única foto que tenho deles, espero um dia poder retribuir de fato a ajuda.

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Feliz da vida por escapar da neve, retomei a Glenn Highway para o destino final de Fairbanks onde eu iria começar o primeiro dia da caçada da aurora boreal, tão feliz que  nem percebi que estava a 90 mph (o máximo permitido era 60). Surge então do meio da floresta uma viatura da polícia com trezentas sirenes ligadas. Eu estaciono.

Depois de responder que eu era brasileiro, bonzinho e atrasado para ver a aurora boreal, ele me deu conselhos de velocidade (assim como minha mãe) e me explicou onde ficaria o melhor lugar para ver a aurora em Fairbanks. Escapei de 130 dólares de multa!

Chego no hostel em Fairbanks às 23h com o termômetro já marcando -10°C. Conheço ali o Alex e Ellen, os donos do hostel, muito atenciosos que me explicaram o mesmo lugar que o policial já havia dito sobre a aurora.

Antes de contar sobre a caçada em si, se diz “caçar” auroras porque você precisa estar atento a uma combinação de fatores:

  • O céu precisa estar limpo, sem nuvens (weather.com).
  • Consultar a previsão de intensidade de Aurora (0 a 9) no dia e no horário da madrugada ela deverá acontecer.
  • Precisa ser um lugar com pouca ou zero interferência de luzes, da cidade ou de carros. Ou seja, um lugar distante e isolado.
  • Tentar ir nas semanas próximas ao equinócio vernal e invernal, pois são nessas semanas que os ventos solares atingem com a melhor inclinação possível.
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Tinha pesquisado tudo isso antes de ir e escolhi a semana justamente anterior ao equinócio invernal. O problema é que a previsão apontava céu nublado no fim de semana, então preferi passar 3 noites em Fairbanks para garantir que conseguiria ver.

Passeei rapidamente pela cidade, peguei uma comida mexicana no Taco’s Bell e segui 30 minutos em direção ao norte de Fairbanks, na Steese Highway, até o ponto de caçar a Aurora. A estrada estava deserta, mas ao chegar lá me deparei com dezenas de carros no meio da escuridão e várias câmeras apontadas para o céu aguardando a hora chegar. Era quase meia noite e a ansiedade tomava conta.

Fora do carro estava -20°C, o que não permitia ficar mais do que 15 minutos em pé. Esperei dentro do carro até que vi uma luz verde brilhante nascer no horizonte. Nessa hora todos começaram a ligar as câmeras e ouvi um “It’s time!” à la UFC. E então, começou!

Lentamente, numa espécie de dança com explosão de big bang, a aurora começou a subir e alcançar o topo das nossas cabeças. Era algo surreal, parecia que o céu conversava comigo, parecia que existia alguém por trás daquilo tudo. Durou cerca de 40 minutos, e até hoje eu lembro de cada um deles…

Roadtrip no Alaska

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  • Dia 5: sábado, 12 de março de 2016, Fairbanks (dog races e Ice Fair)

Depois de acordar só ao meio dia (deu pra descansar do dia, noite e madrugada anteriores), fui a uma corrida-esqui muito tradicional no Alaska puxado por cachorros. Tudo acontece na Associação de Mushers (criadores) da cidade, e vem gente de todos os cantos para participar. São diversas categorias: 2 cachorros + esqui e 4/6/8 cachorros + trenó.

Se antes da corrida começar os cachorros se divertem no “aquecimento”, na hora da largada eles ficam ensandecidos. Tenho a certeza que se eu nascesse cachorro na vida, escolheria o Alaska!

Roadtrip no Alaska

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Mais dois vídeos:

Depois de assistir às corridas, fui para a Ice Fair, uma feira de inverno que tive a sorte de conhecer. Além de muitos brinquedos de gelo para as crianças se divertirem, ainda tinha uma competição de esculturas de gelo com premiação de até 10 mil dólares. Uma mais perfeita que a outra.

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  • Dia 6: domingo, 13 de março de 2016, Fairbanks (fontes termais e sled dog)

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Acordei cedo e peguei a estrada de 100km rumo a Chena Hot Springs: um conjunto de fontes termais no meio das montanhas. A estrada é um pouco perigosa, principalmente quando está congelada, fazendo o carro derrapar bastante nas curvas (minha habilidade em fazer drifts melhorou de 0 a 10 nessa viagem).

O lugar é surreal, a diferença de temperatura entre água e ar chega a ser de 80°C, podendo congelar rapidamente o cabelo e a barba. Se isso acontecer, não mexa com a mão, senão o cabelo (ou a barba) quebra; o que precisa fazer é mergulhar de novo antes de sair. É engraçado ver a mulheres morrendo de medo de estragar o cabelo!

Roadtrip no Alaska

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Voltando para Fairbanks, aproveitei pra visitar o canil da cidade (aqui eles amam cachorros até mais do que brasileiro) e fiz um passeio de sled dog (trenó de cachorro). Este meio de transporte é extremamente antigo por aqui e ainda muito utilizado nas regiões mais isoladas.

E se você ficar com dó do cachorro, fique de mim que paguei USD20, porque para os cachorros é uma festa só. Os mushers se preocupam em trocar frequentemente os cachorros para que nenhum canse demais ou se machuque. O duro é tirar eles do trenó…

Roadtrip no Alaska

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Vídeo:https://www.youtube.com/watch?v=by6hzncZqIg

  • Dia 7: segunda-feira, 14 de março de 2016, Denali Park

Logo cedo parto de Fairbanks de volta para Anchorage para pegar o voo à noite. No caminho, fica o Denali Park, o maior dos Estados Unidos e um dos mais famosos do mundo e nele está o Monte McKinley, a montanha mais alta do país com 6.181 metros. Cerca de 4h de viagem cheguei a essa montanha que é mesmo colossal, mesmo à distância.

Roadtrip no Alaska

No inverno ela é fechada por conta da neve, mas no verão tem expedições diárias para escalar. É possível também sobrevoar todo o parque e até pousar numa geleira, mas preferi não fazer por causa do preço (USD300 por 4h de voo) e do tempo.

E é com esse por-do-sol de pré-aurora boreal que me despeço desta terra que me deu os dias mais incríveis da minha vida: com tantas aventuras, momentos de reflexão, novas amizades.

Espero ter inspirado muitos com essa viagem e deixo uma das maiores mensagens do filme Into the Wild:

“The very basic core of a man’s living spirit is his passion for adventure. The joy of life comes from our encounters with new experiences, and hence there is no greater joy than to have an endlessly changing horizon, for each day to have a new and different sun.”

Roadtrip no Alaska

Importante!!! o Alaska do Inverno é completamente diferente do Alaska do Verão, o que não significa ser melhor ou pior, e sim complementares! No Verão, o Alaska se torna a meca dos esportes de natureza, como canoagem, kayak, escaladas e trilhas longas. Inclusive, é o estado com maior número de empresas de aventura per capita dos EUA.

Agora é com você. Decida qual Alaska vai querer visitar. Mas uma coisa é certa: serão os dias mais incríveis da sua vida. Como os alaskans dizem: happy trails, my friend.

Fernando topou o desafio de contar pra gente como foi sua viagem ao Alaska. Ela é Gente que Ama Viajar.

E você, também ama viajar? Tem dicas legais e quer compartilhar com seus amigos, família e outros viajantes? Escreve pra gente contando sua ideia. Clique aqui ou escreva um email para contato@contosdamochila.com.br. Quem sabe o próximo post não será publicado por você?

Obrigada por ler! <3

Neste post, faço menção a alguns produtos e serviços de viagem. Sempre que você reservar ou comprar alguma coisa por meio do blog, eu ganho uma comissão. Mas garanto que nada ficará mais caro para você, ok?

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2 COMENTÁRIOS

    • Oi Adson! Eu também tive certa dificuldade em achar muita informação em português, mas há alguns bons relatos de mochilões em fóruns por aí (além do meu hehe). Você pretende ir no verão ou no inverno? São roteiros bem diferentes e dependendo de qual escolher posso te sugerir opções! Abraços

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