Consigo me lembrar da primeira vez que ouvi falar do apartheid: foi ainda na escola, em uma aula de geografia. Me lembro também que a alusão ao tema foi muito rápida e um tanto superficial, mas hoje eu não culpo meu professor pela falta de informação. Em 1996, quando eu tive essa aula de geografia, eu completei 13 anos de vida e posso dizer que a África do Sul completou 2. O regime do apartheid chegou ao fim total e absoluto em 1994, quando Nelson Mandela se tornou presidente do país.
E foi dentro do museu do apartheid, em Joanesburgo, que minha ficha caiu. Temos aquele conceito de que museu abriga histórias de um passado muito distante, distante o suficiente para não se conhecer ninguém que tenha vivido a experiência que ele retrata. Mas 21 anos é muito pouco, muito pouco mesmo. Todas as pessoas negras que trabalhavam no museu tinham mais de 20 anos e, portanto, estavam lá, presenciando, e vivenciado, o relato da própria história. Me arrepio toda vez que penso nisso. Quando visitamos o Museu da Revolução em Cuba, chegamos ter um sentimento parecido, porque a Revolução Cubana tinha 50 anos, mas conhecemos poucas pessoas velhinhas que tivessem participado da luta.
1948 é o ano. Ano do início oficial do regime de segregação, quando o então presidente da África do Sul aprovou as leis que legitimavam o apartheid. Logo, todas as pessoas negras, asiáticas e indianas do país começaram a ser registradas pela sua cor e elas eram obrigadas a carregar esse “documento da cor” 24 horas/dia. Se qualquer uma dessas pessoas fossem pegas pela polícia sem o documento, elas poderiam ser presas imediatamente. Imaginem qual a frequência com que isso acontecia?
O regime proibia que brancos e negros se misturassem, não podiam andar na mesma calçada, usar o mesmo banheiro ou comer nos mesmos lugares. Mas isso a maioria das pessoas já ouviu falar. O que nós descobrimos lá dentro do museu do apartheid foi que não era permitido entrar no mesmo banheiro, usar a mesma cabine de telefone público e (chocada!) não era permitido a um negro dirigir a palavra a um branco sem permissão. Além de separadas fisicamente, as escolas também tinham currículos diferentes. Os negros, asiáticos e indianos só podiam aprender os ofícios específicos que interessavam aos brancos. Tudo, absolutamente tudo, denunciava a segregação.
Eu poderia encher linhas e linhas com exemplos abomináveis, mas acho que já consegui dizer o que queria. O discurso geral que os brancos defendiam era que a África do Sul deveria se tornar um pais de pessoas brancas; e por isso, os brancos tinham o dever cívico de não se misturar com outras raças (tenho a impressão de que já ouvi/li isso antes!)
Em si, o museu do apartheid é lindo e ótimo. Objetivo e direto, ao mesmo tempo, sutil e delicado. A arquitetura moderna, mas sóbria, remete à frieza com que os negros eram tratados. Bastante rico em imagens e com vídeos muito bons, o museu também tem seu lado criativo e quer proporcionar experiências aos visitantes.
Uma delas, por exemplo, é no momento de compra do ingresso e acesso ao museu. Aleatoriamente, os visitantes são classificados como europeus ou não-europeus (não-brancos) e, dependendo da classificação, as pessoas só podem usar a entrada permitida pra elas. No caso, eu recebi o ingresso “negro” e Paulinho o ingresso “branco” e isso nos separou na entrada e também dentro da primeira ala do museu.
Há no museu também uma exposição belíssima sobre a vida do Mandela, o homem que se tornou presidente do país após 27 anos na prisão. Entre suas maiores crenças estava a luta sem violência e a convivência democrática entre todo os cidadãos sul-africanos.
2014 foi um ano de festa para a África do Sul. O país celebrou 20 anos do fim do apartheid e do nascimento da democracia, mas isso é apenas o começo, porque ainda há segregação. Uma segregação não oficial, mas que mantém os negros morando nos subúrbios, ocupando os piores postos de trabalho e com poder aquisitivo infinitamente menor que os brancos. Afinal, são só 21 anos. As marcas ainda estão fortes, as cicatrizes bem visíveis, não somente no corpo, mas no coração e na mente.
Informações úteis Museu do Apartheid
- Preço ingresso: 65R ( estudante, 50 R)
- Como chegar: é longe do centro. Taxi é bastante caro. Nós optamos pelo ônibus de turismo Sightseeing.
- Quantas horas reservar: se você gosta muito de conhecer a história, 4 horas no mínimo. Se você só quer dar uma passadinha, 2 horas é suficiente. Lembrando que leva 1 hora pra ir e 1 pra voltar.
- O que fazer nas redondezas: visitar o bairro de Soweto, que é perto. Dá pra usar o ônibus do Sightseeing, mas tem um acréscimo no valor.
Adorei o post, adoro história, tenho certeza que ia adorar esse museu. Aliás, a Africa do Sul é um destino que tá na minha lista pra visitar há tempos, morro de vontade de conhecer!!
Oi Ana! Não deixe de visitar o país então, história é o que não falta. Fiquei feliz com a sua visita! beijos
Pouco se fala da África no Brasil apesar de sermos, se não me engano, o segundo país negro do mundo, depois da Nigéria. História então, nem se fala! Eu tenho verdadeira adoração pela África e se pararmos pra pensar muitos países tiveram a sua independência nos anos 60. Africa do Sul está na minha wishlist e adorei ler seu relato! Beijos
A África é incrível mesmo! É uma das minhas prioridades nos próximos dois anos! História, cultura, natureza, comida, tudo é demais! Quando for a África do Sul e quiser mais dicas é só pedir! beijo
A primeira vez que sonhei em viajar na minha vida, eu queria conhecer a África do Sul. Ainda não tivemos oportunidade, mas certeza que vou querer conhecer esse Museu.
Eloah, que legal que a África do Sul faz parte dos seus planos. Recomendo fortemente. E sem dúvida, vocês devem conhecer o Museu. É demais! Se precisar de mais dicas, é só dar um toque aqui. 😉
Gente! Eu me emocionei de ler o post, sempre fico muito tocada nesses assuntos mais sensíveis. Quando eu for para a África do Sul com certeza vou visitar este museu.
Daniele, esse é um assunto bem sensível mesmo, mas o Museu é muito bom e sabe tratar dessa parte da histórica com muita sensibilidade e honestidade. Eu adorei! Recomendo muito!
Eu acho que esse tipo de lugar deve ser visitado para que uma monstruosidade dessa não seja repetida, me fez lembrar Auschwitz
Paula, concordo muito com você. Escrevi exatamente isso no post que tenho sobre Aushwitz.
Oi Pam! Eu não fui pra Joanesburgo infelizmente, fiquei só em Cape Town/Rota Jardim e arredores então não tive tanto contato com esse lado da África do Sul. Mas adorei visitar a Robben Island, onde o Mandela ficou preso um tempão! A gente acaba nem estudando tanto assim essa parte da história na escola ne? Aí é bom aprender durante viagens…
Oi Fernanda, viajar é ótimo para aprender coisa, né? E o Museu do Apartheid é praticamente uma parada obrigatória em Joanesburgo!